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just life

já não há cartas de amor como antigamente.

Minha querida Felismina,

Bem sabes como sofre o coração deste pobre e velho marinheiro, por não conhecer a correspondência do teu amor. O amor… Felismina… o amor quando nos toca é como se tocasse um sino… um hino… sei lá! o trino de um alegre passarinho…

Felismina, eu quero voar para o teu ninho… (ah, esta tá boa, “voar para o teu ninho”!) e fazer o pino… (“fazer o pino”?!) Pronto, faço o pino! Ah, Felismina, as coisas a que o amor nos sujeita… Por ti eu fazia o pino… já não sei, que desatino!

Mas que hei-de eu fazer, Felismina? O amor é um furacão, desgovernando a minha embarcação…

Felismina, abranda a tua tempestade e manda-me uma brisazinha para atiçar as brasas em que vive o meu coração.

Pires.

(d’Os amigos do Gaspar)

que ataque de saudosimo inopinado! :D

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in the netherlands just life

do estado deste quarto (e deste blog)

tenho o quarto em escombros. de tecido, de meias pelo chão. de restos de música, recibos de visitas curtas, carimbos, flores a murchar, postais, café, linhas de esquemas e colunas de valores bem alinhados, livros, pacotes de sumo lavados (para um armário de pequenas portas), a revista da cidade, as canetas preferidas da stabilo, a caixa das aspirinas das dores de cabeça contínuas e desgastantes dos últimos dias. a música espanhola animada que passa pelas paredes do quarto vizinho, ou as discussões apaixonadas, do outro lado, que às vezes se sentam no meu colo, em soluços, e me lembram que ainda tenho muito para aprender.
algumas visitas marcadas, as reuniões em letras grandes, para não me esquecer mesmo, as calças da chuva a secar.

mas tenho tido ideias. escrevinho, desenho, desarrumo um pouco mais. todos os dias me vêm aos olhos pedaços de projectos, de coisas que quero misturar e que acabam misturadas em cima da minha minuscula mesa, pelo “sofá” improvisado. em cima e por baixo de outras coisas, esquecidas, re-descobertas.
sempre para dar a alguém, sempre com gente em mente.
imponho a mim mesma deadlines, mas não era preciso: quando se abre a portinha das coisas que gosto, elas acabam depressa demais.

andamos assim.

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just life photography

the ode to dad.

(i saw rita made a post about her dad, and i suddenly felt like doing something similar here too. thanks for the idea :) )

my family was always a different one.
mom worked a lot. more than 30 hours in a row, at least twice a week (and amazingly, she still does). when she was home, we weren’t allowed to make any noise – a rule which later was responsible for us listening to music much lower than most people, i think.

so, anyway, how did me and my brother end up normal healthy kids?
yes, you might have guessed it, the trick was my dad. he woke up early, fed, washed, drove us to school, went to the teachers meetings, took us to the hairdresser and the dentist, invented new foods (pasta with sausages was his and our favourite!) etc etc etc.
on top of it all, he still had a semi-normal job with some degree of liberty and he helped my mom with the housework. wait, i know what you are thinking – “helped with the housework” is an ironic expression that is often a sinonym of joyfully washing the dishes once a week.
well, that wasn’t the case at all. the proof is i’ve never seen my mom ironing any single piece of clothing or vaccum cleaning.
that’s just the way it is.

dad.

< we've had our ups and downs, but some people are special, i guess. my most treasured memories are from a period in which my mom was finishing some sort of degree or post-graduation and she had to study a lot. my dad would take us two to porto on the train with a kilo of rice and we'd spend the afternoon there, feeding the pidgeons. on the picture you can see him and nani, my little cousin – who we took there a few years ago, just for the fun of doing it once again. we still love it. and i love you dad. :) ps – paizito. já sei que não percebes o que eu escrevi ali em cima, mas não tem mal. já te disse tudo quando te liguei hoje. resumindo, gosto muito de ti. continua a fazer massa com salsichas e tudo, que a gente adora. beijocas.

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in the netherlands just life

stikstof

(i’m too tired to write in english, sorry people).

estive a semana passada em portugal. tinha saudades de tudo. dos amigos, dos papas, dos ralhetes. da minha cama, do cheiro do meu quarto, das toalhas da minha mae. das francesinhas e da comida temperada com antecedencia. dos brinquedos, das lombadas dos livros, das caneladas na mobilia. das lojas a fecharem a horas decentes. do autocarro, do metro, do comboio, do fiesta, do vaivem. de perceber o que se diz ao meu lado. das festas de anos, de poder beijar toda a gente e nao ter de estender a mao e dizer o nome. das tias a falar alto.
de mais coisas que as que o meu estado actual me deixa agora enumerar.

tenho o humor moldado (colado) a uma combinacao de cansaco e cafeina. comecei o estagio na segunda, mas nem e so disso – acho que descubro agora o quanto de incompativel a minha vida de estudante tem com esta – e nao estou a falar das borgas, desenganem-se.

tenho boa vontade. mas ninguem me disse que ia estar tudo em holandes (alias, de “nao te preocupes, nao vais ter chatices” ate “pois… mas a documentacao e os relatorios estao em holandes… ate os comentarios no codigo” ainda vai um pedacinho), e que convinha eu perceber alguma coisa. mas porque raio pensei eu que ia ser facil…? os babelfish e worldlingos desta vida dao muito jeito, e ate ja comeco a ficar perita, para alem de estar a aprender vocabulario a um ritmo impressionante. devia ter ido para tradutora diz a minha mae (sim, devia maezita, podia ser que virasse uma nicole kidman nas nacoes unidas), o jeito para as linguas… enfim, nao da para seguir uma conversa, mas percebem-se algumas coisas. stikstof, por exemplo, que quer dizer nitrogenio. ou seja, e a minha vida, neste momento. prever a quantidade de stikstof (ler shtikshtof) que se produz neste pais, para fins calorificos. assim, por alto.
das 9 as 5 sou um deles. mais um, num dos 17 andares, a saltitar na alcatifa. quando saio estou demasiado cansada para pensar, para arrancar a tag com o nome do bolso das calcas, para guiar a bicicleta sem ser em piloto automatico.

dou gracas pelas poucas pessoas que espreitam o gabinete com ar curioso (sou um peixe raro, uma miuda estrangeira num departamento de tipos holandeses) e me tiram da frente dos olhos a folha de calculo, e faco conversa. eles aproveitam para treinar o ingles (ou se calhar estao tao mortos de tedio como eu), nao e que precisem, mas alguns ate parecem gostar (hoje ate frances falei!)

mas ainda ha coisas que nao me entram na cabeca. meia hora para almoco?! sentam-se, comem as sandes com faca e garfo, todos finos e executivos e deixam os tabuleiros todos desarrumados, vao-se embora. tudo em 15 minutos. nao percebo o que dizem, por muito que me esforce so apanho dias da semana, numeros, coisas soltas. e passo o resto da tarde a escrevinhar o que vou aprendendo das traducoes forcadas.
demora tempo, impaciento-me, quero fazer outra coisa qualquer. e depois reparo que nao estou por minha conta, e que tenho mesmo de me concentrar. o projecto ate e interessante, conceptualmente. na pratica… bem, adiante.

e se dantes ja me irritava o fechar das lojas as 6, agora entao…

ps – de onde veio esta onda de resmunguice agora? perdoem. o sono, o sono. mas espero conseguir aprender holandes bem rapido, tres dias e começo a impacientar por nao falar e nao perceber nada do que dizem entre eles. do que se riem? tambem quero! :(

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just life

o amor fechou a tasca

would you?

"Estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr o risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o medo, o desequilíbrio, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho" sentimental. Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso."

Miguel de Esteves Cardoso